
Em fevereiro completa um ano da primeira fuga do sistema penitenciário federal desde a inauguração da série de cinco presídios de segurança máxima há 18 anos. Na época, o governo prometeu construir muralhas novas, mas só uma foi iniciada e a perspectiva é que sejam necessários pelo menos mais três anos para fazer quatro muros.
A fuga do ano passado expôs fragilidades à segurança pública no governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e apresentou um dos primeiros desafios do ministro da Justiça Ricardo Lewandowski logo após assumir a pasta.
Dois detentos de baixo escalão do Comando Vermelho conseguiram fugir do presídio de segurança máxima de Mossoró, no Rio Grande do Norte, sem plano ou ajuda externa. Eles escaparam de uma cela por uma luminária e se esgueiraram até o perímetro externo do presídio, onde cortaram uma pequena cerca e desapareceram.
Com a fuga, Lewandowski prometeu urgência na construção de muros, mas ele não deu um prazo e as obras não foram concretizadas. Para enfrentar o problema na violência no país, o governo federal tem se voltado mais para políticas de desencarceramento e imposição de regras mais brandas para abordagens policiais nos estados.
A ideia de construir imensas muralhas blindadas e capazes de suportar ataques de ‘guerra’ em torno das unidades prisionais, para dificultar fugas e eventuais ações de resgates vinha do governo de Jair Bolsonaro (PL). A estrutura de Brasília, última construída e inaugurada em 2018, é a única a contar com uma muralha.
Mas falta levar o projeto adiante em outras quatro penitenciárias. O projeto prometido pelo ministro da Justiça está orçado em R$ 160 milhões. A única nova obra iniciada após a fuga foi em Porto velho (RO), em 2023. Mas ela teve atrasos, aumento de custos operacionais e um suposto erro de projeto. O Ministério da Justiça nega o erro. Ocorre que a estrutura que deveria ser entregue em março deste ano está com apenas 11% dos serviços concluídos, segundo informou o próprio governo federal à Gazeta do Povo.
A escolha da unidade de Porto Velho para receber a primeira muralha não foi por acaso. Em 2022 foi revelado um plano cinematográfico para resgatar o líder do Primeiro Comando da Capital (PCC), Marcos Willians Herbas Camacho, o Marcola, custodiado na época naquela estrutura. Autoridades em segurança chegaram a afirmar que 90% do plano estava pronto e custaria à organização criminosa R$ 60 milhões com direito a uso de aeronaves, veículos blindados, armas de grosso calibre e criminosos altamente especializados para a ação.
Mas o plano foi descoberto e Marcola foi transferido para Brasília. O governo Bolsonaro confirmou a construção da muralha no presídio federal de Porto Velho com a licitação da obra. Em janeiro de 2023, Lula assumiu o governo e de lá para cá pouco evoluiu.
No caso dos dois presos fugitivos de Mossoró no Rio Grande do Norte, não existiu nenhum esquema meticuloso para fuga, muito menos de resgate. Eles deixaram a unidade prisional sem dificuldades, ao detectarem uma falha estrutural sob as luminárias das celas onde estavam. Saíram pelos buracos das luminárias, caminharam por dutos, romperam cercas com ferramentas de uma obra realizada na unidade e ficaram pelo menos 51 dias em fuga.
O governo federal gastou R$ 6 milhões nas buscas com mobilização de centenas de servidores da segurança, drones, helicópteros e equipes especializadas. Quase tudo sem sucesso. Quando a força-tarefa estava prestes a ser desmobilizada, os dois fugitivos foram localizados em Marabá (PA), a cerca de 1,6 mil km do local da fuga e voltaram para o sistema. Acuado com a situação, Lewandowski logo tratou de anunciar a aceleração da construção de imensas muralhas também nos presídios federais de Mossoró, o próximo na lista, Catanduvas (PR) e Campo Grande (MS).
Cada muralha vai custar, segundo a Secretaria Nacional de Políticas Penais (Senappen) vinculada ao Ministério da Justiça e Segurança Pública, R$ 40 milhões. A de Porto Velho, no entanto, já está na casa dos R$ 45 milhões. Apesar de ter sido projetada ainda do governo de Bolsonaro, ela começou a ser construída no fim de 2023 no primeiro ano da gestão de Lula. A previsão era ser entregue em março deste ano, mas os cenários de atrasos se iniciaram nos primeiros meses de edificação. Neste momento nem cronograma definido para a entrega a Secretaria tem. A pasta não justificou o porquê do custo mais elevado que o previsto inicialmente e o que levou aos atrasos.
A própria secretaria admitiu à Gazeta do Povo que “atrasos na execução da obra em 2023 não permitirão a entrega no prazo planejado [março de 2025]” e que mesmo assim, “não há previsão de rompimento do contrato, mas [está ocorrendo] a apuração dos motivos para o atraso de obra, nos termos do contrato, que pode levar a sanções”. A Gazeta do Povo identificou que o caso é apurado em um processo administrativo. A Secretaria Nacional de Políticas Penais disse que trabalha em um novo cronograma com a empresa contratada, após alinhamentos com a consultoria jurídica da pasta.
Por Juliet Manfrin