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Pequenos produtores de manga buscam voo solo na exportação

No Vale do São Francisco, eles se movimentam para depender menos das grandes empresas do segmento para vender no exterior

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Pequenos produtores de manga buscam voo solo na exportação

É fim de novembro e o sol arde sobre os pomares de manga e videiras irrigados no Vale do São Francisco. A apreensão com o tarifaço imposto pelo governo Donald Trump, que nublou o horizonte por mais de três meses, ficou para trás após a retirada das taxas sobre a manga e agora produtores da região, principalmente os de menor porte, miram a diversificação de mercados. Mas não só. Eles também querem depender menos de grandes parceiros exportadores para vender ao exterior.

Georgeano Santos, de Juazeiro, no norte da Bahia, é um desses pequenos produtores. Ele cultiva manga numa área de 26 hectares no Rancho Sagrada Família e produz 1 mil toneladas da fruta por ano. Cerca de 85% são destinadas à exportação para mercados como União Europeia, Estados Unidos, países do Mercosul e também Coreia do Sul. Mas apenas 10% desse volume é vendido diretamente. O restante é comercializado no exterior por grandes empresas produtoras de frutas da região.

“Um dos grandes desafios para o ano de 2026 é buscar acesso ao mercado de uma forma mais direta, porque é isso que vai fazer com que saiamos dessa condição de produtor com a margem de lucro um pouco mais apertada”, afirmou Santos a um grupo de jornalistas que acompanhou a visita de potenciais clientes estrangeiros a propriedades de frutas do Vale do São Francisco em novembro.

“Nós temos o mundo para ampliar ainda e capacidade de entrega de fruta”, disse ele, que vem de uma família de pequenos agricultores e começou a cultivar manga em 2009, após adquirir lotes no âmbito do Projeto Público de Irrigação Salitre, da Codevasf (Companhia de Desenvolvimento do Vale do São Francisco).

Além dos 26 hectares já em produção, outros quatro estão em fase de implantação na propriedade. E Santos avalia que o volume atual de 1 mil toneladas de manga já lhe permite dar passos mais largos. Na fazenda, ele cultiva as variedades palmer, tommy, keitt e kent.

No começo, o produtor, que é técnico agrícola e administrador de empresas, trabalhava em outra atividade para pagar as contas. “No início eu precisava prestar serviço no mercado ao mesmo tempo em que tocava a agricultura. Graças a Deus as coisas foram acontecendo, fomos reinvestindo os lucros, [já] que é um negócio relativamente rentável, e com o tempo fomos ampliando”, contou.

Os investimentos em tecnologia e em manejo — com melhor controle de solo, da nutrição e dos tratos culturais — possibilitaram ganhos de produtividade, segundo ele. “Como nossas áreas não são tão extensas, tivemos que buscar uma capacidade produtiva mais eficiente. Há 10 anos, nossa média de produtividade era em torno de 25 toneladas por hectare. Agora, já estamos atingindo 35 a 40 toneladas. Isso na mesma área”.

Francisco Luiz Torrisi, dono da fazenda Barach, em Juazeiro, é outro produtor que se movimenta para fazer vendas diretas de manga ao exterior. Hoje, o filho de italianos que chegaram à Bahia em 1972, exporta em torno de 88% de sua produção, e a venda é feita por grandes empresas de frutas.

Mas ele trabalha para mudar essa dinâmica e diz que o objetivo no curto prazo é ter 50% das exportações feitas de forma direta. “O nosso volume é de 1.200 toneladas ao ano, e até 2030 temos um projeto desafiador de quadruplicar para 5 mil toneladas, por isso o esforço para buscar novos clientes no exterior”, já que o mercado interno ainda não absorve a oferta.

Para abrir mercados, a Barach fez parceria com um escritório especializado, que a tem acompanhado em feiras e rodadas de negócios. Torrisi também levou consultores de vendas para dentro da fazenda para entenderem a operação, como a fruta é produzida e seu diferencial, visando impulsionar a área comercial. “Sabemos que há mercados que valorizam a história por trás de um produto”, disse.

Ele produz manga desde 2018, e assim como Georgeano Santos iniciou o cultivo em seis hectares do Projeto Salitre. Nos anos seguintes, foi comprando novos lotes e hoje tem uma área de 218 hectares, sendo 68 ocupados com manga das variedades palmer, principalmente, além da tommy e da keitt.

Segundo Torrisi, uma estratégia adotada foi ter todas as áreas na região do Salitre, onde o solo é rico em cálcio. “É o segredo do nosso fruto, justamente o solo mais resistente. (...) Cálcio é um nutriente que dá mais resistência às moléculas da polpa da manga”, explicou a jornalistas, também durante a visita do grupo de potenciais clientes estrangeiros. Isso significa frutas mais firmes e com maior tempo de prateleira, acrescentou.

Para atingir os volumes de produção desejados, a Barach vai cultivar manga em 138 hectares. “Vamos implantar mais 32 em março de 2026 e, até dezembro, os 38 hectares restantes”, disse Torrisi.

No roteiro da visita dos potenciais clientes — iniciativa chamada de Projeto Comprador, criada por CNA, Sebrae e Apex — também havia uma grande produtora e exportadora de frutas: a GrandValle, de Casa Nova. A empresa, que fatura R$ 700 milhões ao ano, é uma das que comercializam no exterior as mangas produzidas por Santos e Torrisi. Mas também ela busca ampliar seus mercados e negócios.

Segundo Gilberto Secchi, que fundou a companhia em 1988, hoje a GrandValle tem 600 hectares cultivados com manga e 150 com uva de mesa. “Mas nossa produção só representa 30% do comércio que temos pelo mundo. 70% vêm de compras”, disse. Sem a fruta de terceiros, não seria possível atender os clientes da América do Norte, América do Sul, Europa e Ásia.

O plano da GrandValle prevê ampliação da produção. “Temos mais 2 mil hectares para expandir, em quatro a cinco anos”, disse Secchi, acrescentando que mesmo assim ainda será preciso adquirir frutas de outros produtores.

De toda manga e uva que chegam ao ‘packing house’ da GrandValle, cerca de 60% são destinados à exportação. Só de manga, a empresa recebe por dia até 16 caminhões na temporada que vai de agosto a novembro.

Para o grupo de estrangeiros que participou do Projeto Comprador no Vale do São Francisco, as visitas são uma oportunidade de conhecer a produção da região, para eventuais negócios no futuro.

A bielorussa Volga Bazyleva, que estava no grupo, atua na From All The World Pte, empresa de consultoria em comércio exterior de Cingapura. “Estou aqui para entender a produção no Brasil, (...) para ter as informações sobre como funciona a exportação, preços, qualidade”, disse. Essas informações, contou, são compartilhadas com clientes em Cingapura, e de países como China e Líbano, interessados em conhecer os produtos para vender em seus mercados.

Diry Khandan, da holandesa Kurdino, fazia sua segunda visita ao país. “O Brasil tem capacidades e possibilidades ilimitadas, especialmente quando buscamos frutas frescas”. Ele já comercializa mangas fornecidas por uma empresa brasileira localizada na Holanda. “Mas quero trabalhar diretamente com um exportador”.

A jornalista viajou a convite da Federação de Agricultura e Pecuária da Bahia